segunda-feira, 19 de abril de 2010

Os escândalos da pedofilia

por Marcello Pêra,
italiano, filósofo agnóstico e senador.
Publicado no Corriere della Sera 17.III.10

A questão dos padres pedófilos e homossexuais que surgiu recentemente na Alemanha, tem como alvo o Papa. Cometer-se-ia, no entanto, um grave erro se pensássemos que o golpe não conseguiria atingir o alvo, dada a enormidade da iniciativa. E seria um erro maior ainda se se considerasse que a questão será rapidamente ultrapassada, como tantas outras. Não é assim. Está em curso uma guerra. Não apenas contra a pessoa do Papa porque, nesse campo, a guerra é impossível. Bento XVI tornou inexpugnável na sua imagem, na sua serenidade, na sua limpidez, firmeza e doutrina. Basta o seu sorriso manso para derrotar um exército de adversários.
Não, a guerra é entre o laicismo e o cristianismo. Os laicistas sabem que se um esguicho de lama atingir a batina branca, conseguir-se-á sujar a Igreja e, se se sujar a Igreja, então ter-se-á também sujado a religião cristã. É por isso que os laicistas acompanham a sua campanha com perguntas como: “Quem mandará ainda as suas crianças à Igreja?”, ou, “quem mandará ainda os seus filhos para um colégio católico?”, ou mesmo, ainda, “quem irá tratar os seus filhos num hospital ou clínica católica? “. Há alguns dias atrás, um laicista deixou escapar a sua intenção. Escreveu assim: “a extensão da difusão do abuso sexual de crianças por padres põe em causa a própria legitimidade da Igreja Católica, como garante da educação dos mais pequeninos.” Não importa que esta sentença não tenha provas e esteja cuidadosamente escondida sob a fórmula “extensão da difusão”: um por cento de padres pedófilos? Dez por cento? Todos? Não importa que a sentença seja desprovida de lógica: basta substituir “sacerdotes” por “professores”, ou por “políticos”, ou por “jornalistas” para “minar a legitimidade” das escolas públicas, dos parlamentos ou da imprensa. O que importa é a insinuação, mesmo à custa da grosseria do argumento: os padres são pedófilos, assim a Igreja não tem autoridade moral, logo a educação católica é perigosa, pelo que cristianismo é uma fraude e um perigo.
Esta guerra do laicismo contra do cristianismo é uma batalha campal. Deve-se trazer à memória o nazismo e o comunismo para encontrar uma situação similar. Mudam os meios mas o fim é o mesmo. Hoje, como ontem, o que se pretende é a destruição da religião. Na altura a Europa pagou o preço por esta fúria destrutiva com a sua própria liberdade. É incrível que, especialmente na Alemanha, enquanto se bate continuamente com a mão no peito devido à memória do preço que se infligiu por toda a Europa, na Alemanha que hoje é uma democracia, se esqueça e não se entenda que a própria democracia estaria perdida se o cristianismo fosse apagado. A destruição da religião comportou então a destruição da razão. E hoje não significará o triunfo da razão laica, mas uma nova barbárie. Sobre o plano ético aí está a barbárie de quem mata um feto porque a sua vida seria prejudicial para a saúde psíquica da sua mãe. De quem diz que um embrião é um “monte de células” bom para experiências cientificas. De quem mata um velho porque ele já não tem uma família que o trate. De quem apressa o fim de um filho porque não está consciente e é incurável. De quem pensa que “progenitor A” e “progenitor Pai B” é o mesmo que “pai” e “mãe”. De quem acredita que a fé é como o cóccix, um corpo que já não participa na evolução porque o homem não já não precisa da cauda e está erecto por si mesmo. E por aí adiante. Ou então, e considerando o lado político da guerra dos laicistas ao Cristianismo, a barbárie será a destruição da Europa. Porque, abatido o cristianismo, permanecerá o multiculturalismo, que acredita que cada grupo tem direito à sua cultura. O relativismo, que pensa que cada cultura é tão boa quanto qualquer outra. O pacifismo, que nega que o mal existe.
Esta guerra ao cristianismo não seria tão perigoso se os cristãos a compreendessem. A guerra dos laicistas continuará, senão por outra razão porque um Papa como Bento XVI, que sorri mas que não se afasta um milímetro, a alimenta. Mas se se perceber porque é não se afasta, então toma-se o assunto em mãos e não se espera o próximo golpe. Quem se limita unicamente a solidarizar-se com ele é como alguém que entra no Jardim das Oliveiras de noite e em segredo, ou como alguém que não entendeu o que está a acontecer.

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